Funções atribuídas ao Carf devem ser discutidas e esclarecidas

Funções atribuídas ao Carf devem ser discutidas e esclarecidas

O debate sobre as finanças públicas no Brasil aparece, com frequência, de modo crítico na mídia. Com a crise econômica, o assunto exige ainda mais atenção, já que a queda na arrecadação se reflete negativamente nas contas públicas. A meta para o déficit primário em 2018 (governo central, Previdência e Banco Central) é apontada em R$ 163,1 bilhões. É o quinto ano consecutivo de resultados negativos nas contas públicas. Esse contexto é explicitado nas eleições, em que o tema das finanças ocupa papel estratégico.

O Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) não tem natureza arrecadatória (reservada à Receita Federal) e seu estoque é de cerca de 119 mil processos administrativos, envolvendo uma disputa avaliada em R$ 624 bilhões. Isso coloca o contencioso tributário na atenção dos governantes e explica, de certo modo, por que há tantos projetos de lei sobre reformas no tribunal administrativo, em trâmite no Congresso Nacional.
Esse cenário faz com que pensemos se o papel do Carf é o de equilibrar as contas públicas, ou seja, se a sua natureza é arrecadatória. Analisando-se os dispositivos constitucionais e legais, é evidente que a função do Carf é julgar, em segunda instância administrativa, os processos de exigência dos tributos administrados pela Receita Federal do Brasil. Logo, não tem natureza arrecadatória. O problema acontece quando a arrecadação é sobreposta às garantias constitucionalmente atribuídas aos contribuintes.
O Carf é responsável por assegurar essas garantias estabelecidas na Constituição Federal, como o exercício do direito de defesa antes de qualquer constrição ao patrimônio particular. Esse direito é essencial em um Estado Democrático de Direito, evitando-se, com isso, arbitrariedade e abusos de poder na tributação.
A questão que se propõe é, então, como o Carf pode realizar suas funções da melhor forma possível, libertando-se do viés arrecadatório da Receita Federal. Segundo o  meio jurídico,  a primeira medida deveria ser em relação ao voto de desempate dos julgamentos. Para eles, a solução seria a alternância da prerrogativa da prolação do voto de desempate entre o presidente, o auditor fiscal indicado pelo Fisco, e o vice-presidente conselheiro indicado pelas confederações e sem qualquer ligação com a administração pública. O voto de desempate dos julgamentos é atribuído sempre aos julgadores de representação do Fisco, o que acaba relacionando o Carf à arrecadação.
Os profissionais da área levantam também a hipótese do afastamento das penalidades quando o julgamento for desempatado pelo voto de qualidade. O Código Tributário Nacional garante a exclusão das penalidades em caso de dúvida. O voto de qualidade retrata que existe algum tipo de dúvida em torno da constituição do crédito tributário, pois metade dos julgadores compreende que é necessária a exoneração do crédito, e a outra metade entende a cobrança como legítima. Além disso, não se deve admitir que a autuação fiscal estabelecida pelo voto de qualidade tenha presunção de legitimidade e certeza (ambos são requisitos legais para o ajuizamento da execução fiscal).
A proposta  nessa hipótese, excluam-se as penalidades e que o saldo remanescente da dívida – imposto ou contribuição e juros – seja cobrado sem ação executiva. O Fisco, assim, precisaria de decisão liminar atribuindo força executiva ao crédito tributário mantido por voto de qualidade. Isso exigiria, naturalmente, que a relevância da argumentação e a necessidade da medida fossem demonstradas.
“Com tais sugestões, acreditamos que o Carf poderá desempenhar seu papel constitucional de exame de legalidade das autuações fiscais com maior independência e a salvo de pressões arrecadatórias”, conclue o mercado.
Para finalizar, destacam que nenhum aumento na arrecadação justifica a fragilização do Estado Democrático de Direito.

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