O curioso ato de confessar

O curioso ato de confessar

O que significa confessar? O poeta chileno Pablo Neruda, em sua obra Confiesso que he vivido (1974), exclamava: “Confesso que vivi”!
O cineasta italiano Sergio Leone afirmava que jamais confessaria, após seu filme Per um Pugno di Dollari ser acusado como uma disfarçada cópia de um outro filme chamado Yojimbo, de Akira Kurosawa.
Mas, afinal, o que significa confessar?

De modo genérico, confessar é assumir a ocorrência de um fato, conforme esse sucedeu. Entretanto, na óptica jurídica, a confissão não representa o simples ato de admitir, como faz alguém quando vai se confessar na Igreja, por exemplo. Trata-se, na verdade, de uma prova para os atos jurídicos (CC, art. 212, inciso I), em que só se considera confissão a admissão de um fato contrário ao interesse do respectivo declarante, em um ambiente configurado pelo conflito de interesses (CPC, art. 389).
A confissão tem singularidades: pode ser espontânea, ou seja, por iniciativa da própria parte (CPC, art. 390 e respectivo § 1º), ou provocada, de forma que resulta de um depoimento pessoal em juízo ou extrajudicial (CPC, art. 389). Também se divide em real – quando efetivamente realizada por quem confessou – ou ficta – decorre de uma ficção jurídica, em que se julga algo verdadeiro em razão da revelia, da falta de comparecimento a um depoimento pessoal ou da recusa em depor (CPC, art. 344).
Para ser validada, a confissão precisa de agente capaz (CC, art. 213; CPC, art. 392, § 1º). Pessoas consideradas incapazes, como menores e deficientes mentais, não tem, portanto, capacidade para confessar. A confissão pode ser feita por um representante, mas ele precisa ter direito de fazer isso: nesse caso, quem confessa deve indicar precisamente os fatos que serão confessados em juízo por meio de um representante especialmente imbuído dessa finalidade (CC, art. 213, § único; e CPC, art. 390, § 1º).
Em tese, a confissão não pode ser revogada, ainda que possa ser anulada se decorreu de erro de fato ou de coação (CC, art. 214; e CPC, art. 393). É também indivisível, ou seja, a parte que a invocou como prova não poderá desprezar os aspectos desfavoráveis e aproveitar apenas os aspectos favoráveis (CPC, art. 395).
É no âmbito processual que ocorrem os principais efeitos da confissão. Se, de um lado, a confissão implica abdicação do direito de produzir prova sobre o fato confessado, por outro lado implica liberação da parte contrária em relação ao compromisso de provar o fato confessado (CPC, art. 374, II.).
A confissão ocupa uma posição central nas relações humanas. Como diz Santo Agostinho, a confissão das más ações é a primeira iniciativa para que boas ações possam ser praticadas. Além de aliviar o peso na consciência, é vista como redentora. Sob o âmbito jurídico, a confissão é a prova maior, pois consolida a verdade sobre um fato, liberando o adversário litigante quanto à obrigação de provar em juízo.

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