Quem decide no Banco dos BRICS?

Os emergentes na criação dos novos bancos multilaterais de desenvolvimento. Reunião de chefes de estado e de governo do BRICS, realizada por videoconferência 


O Sistema Financeiro Internacional contemporâneo foi instituído ao final da 2ª Guerra Mundial e se compõe por três principais elementos: (i) a estabilidade econômica, assegurado pelo Fundo Monetário Internacional (FMI); (ii) a liberalização comercial, inicialmente pelo Acordo Provisório de Tarifas e Comércio (GATT) e, a partir de 1995, com a Organização Mundial do Comércio – OMC (World Trade Organization – WTO); e (iii) promoção ao desenvolvimento, com a criação do Banco Internacional de Reconstrução e Desenvolvimento (International Bank for Reconstruction and Development – IBRD).

Ambos o FMI e o IBRD foram criados pelo Acordo de Bretton Woods de 1944 e, por terem sido fundados conjuntamente, são conhecidos como as Instituições Irmãs. Somente em 1944, com o Acordo de Marraqueche, foi constituída a Organização Mundial do Comércio – OMC (World Trade Organization – WTO), esta caracterizada como organização internacional, para fins do Direito Internacional Público. As regras do GATT de 1947 foram, portanto, inseridas no conjunto das regras vigentes da OMC.

No que se refere à promoção do desenvolvimento, o Direito Internacional Econômico envolve um campo de estudo das organizações internacionais dedicadas à cooperação financeira por meio de empréstimos internacionais, doações e assistência técnica. Essas organizações são conhecidas como os Bancos Multilaterais de Desenvolvimento (Multilateral Development Banks – MDBs).

Além do IRBD, criado em 1944, destaca-se o Banco Interamericano de Desenvolvimento (Inter-American Development Bank – IDB)[1] e o Banco de Desenvolvimento da Ásia (Asian Development Bank – ADB)[2], ambos criados na década de 1960, constituindo-se como organizações internacionais tradicionais. Tais instituições enfrentam o desafio de um cenário internacional multipolar com estruturas que respondem parcialmente de forma satisfatória às demandas dos países mutuários.

Além disso, a forma de concessão dos recursos externos varia de instituição para instituição, no qual os mutuários se submetem a diferentes normativas conforme regras específicas (o que diverge do entendimento do uso de sistemas dos próprios mutuários, conhecido como country system). A falta de uniformidade gera fragilidade jurídica nos processos de aquisições e implementação de infraestruturas públicas, com prejuízos à transparência e prestação de contas junto aos órgãos internos de controle dos países[3].

O forte peso econômico das nações emergentes a partir do século XXI se apresenta como fator relevante no debate sobre a reforma das tradicionais organizações de cooperação financeira, principalmente na questão do poder de voto e na conquista de uma maior igualdade de representatividade nas esferas de decisão.

O Novo Banco de Desenvolvimento, ou o Banco dos BRICS (New Development Bank – NDB), o Banco de Investimento e Infraestrutura da Ásia (Asian Infrastructure Investment Bank – AIIB) e o Banco de Desenvolvimento da América Latina (CAF) podem ser considerados como evidências recentes do papel que desempenham na agenda internacional de desenvolvimento.

Agrega-se o fato de que tais organizações foram criadas essencialmente por países emergentes, constituindo-se em uma janela de oportunidade para que definam regras mais transparentes e flexíveis, estratégias de transferência de conhecimento e tecnologia, bem como alternativas financeiras frente aos modelos tradicionais de financiamento.

Em específico, o acrônimo BRIC – Brasil, Rússia, Índia e China – é um conceito criado em 2001 por Jim O’Neill, do Goldman Sachs, que afirmou que esses quatro países juntos poderiam superar as seis maiores economias ocidentais no mundo em 30 anos. Em 2010, o grupo aprovou a entrada da África do Sul, formando o acrônimo BRICS. Os cinco países integrantes respondem por 45% da taxa de crescimento do Produto Interno Bruno global.

Centrando-se no NDB, este foi criado na Cúpula dos BRICS em Fortaleza, no ano de 2014. O Banco dos BRICS possui como objetivo o fornecimento de recursos para infraestrutura e desenvolvimento sustentável. A constituição da divisão do poder de voto é equânime aos cinco membros fundadores: 20% para cada membro (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul). Essa divisão igualitária permite uma estrutura mais transparente e igualitária no processo de aprovação de empréstimos e doações. Além disso, nenhum dos membros possui poder de veto.

Ao contrário, o FMI determina a sua divisão de votos a partir de um percentual de quota diferenciado, conforme seu grau de desenvolvimento econômico e se submete a certo grau de decisão política. A título de exemplo, os Estados Unidos respondem por 16,51% do total das quotas, seguido pelo Japão com 6,15%, correspondendo aos países com maiores percentuais no Fundo. Como somente os Estados Unidos detêm um valor superior a 15%, é o único Estado-membro a exercer real poder de veto nessa instituição.

Frente a esse contexto contemporâneo, as novas instituições de cooperação financeira apresentam inovações em suas estruturas, com a capacidade de oferecer soluções diferenciadas, maior flexibilidade na concessão de investimentos e a possibilidade de emprestar em moedas locais, o que provoca a redução do custo de transação cambial.

Dentre inovações financeiras, ressalta-se a emissão de títulos verdes na China pelo NDB em 2016, a utilização de empréstimos com moeda local, sendo que o NDB já utiliza o Renminbi em quatro de três projetos aprovados na China em 2017. Outra inovação corresponde à aprovação de projetos de infraestrutura a partir de critérios econômicos, sociais e ambientais e o comprometimento do NDB em utilizar sistemas domésticos dos países mutuários, afastando-se da tradicional posição dos MDBs em impor condicionalidades e a aplicação de regras próprias.[4]

Dessa forma, os países emergentes apresentam-se mais atuantes e abertos às inovações no sistema financeiro internacional. Essa constatação se observa em maior demanda de representatividade no poder de voto das instituições financeiras tradicionais, a exemplo da aprovação da redistribuição das cotas do FMI em 2010, com aumento para os países do BRIC (Brasil, Rússia, Índia e China).

Além disso, frente à lentidão das reformas das instituições tradicionais, a criação de novos MDBs demonstra forte compromisso com a igualdade de representatividade e maior abertura para a criação de estruturas financeiras mais próximas à realidade dos países tomadores de recursos externos. A composição da divisão do poder de voto é, portanto, parte essencial no exercício de instituições internacionais mais transparentes.

O Direito Internacional Econômico, em sua contemporaneidade, deve se pautar pelo estudo dos novos MDBs, bem como pela constante evolução de novos institutos e estruturas jurídicas a fim de permitir maior desenvolvimento econômico para as nações.

fonte: JOTA

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