Um dos grandes desafios na gestão do patrimônio familiar é a definição das pessoas que seguirão à frente da gestão dele. Embora certa e inevitável, a morte continua sendo o principal aspecto impeditivo a se implementar uma estratégia sucessória patrimonial que, além de beneficiar os sucessores, poderá também economizar deles dinheiro, tempo e desgaste.
A escolha do sucessor não é um processo simples e envolve aspectos que vão muito além da capacidade técnica dos potenciais candidatos.
Questões fundamentais, envolvendo desde a preferência pessoal do seu gestor atual, tenha ele(a) sido ou não o(a) principal responsável pela formação dele, até a expectativa de um determinado herdeiro em assumir tal posição, são bastante comuns e, caso mal administradas, podem colocar em risco não só a perpetuidade do patrimônio como também a harmonia da família.
Pode-se afirmar, nesse sentido que, enquanto a posição de herdeiro é um direito, a de sucessor é uma conquista.
A definição do papel de cada membro familiar é muito importante para eliminar eventuais conflitos e a implantação de uma sólida governança familiar auxilia neste processo definindo, não só o papel de cada um, mas também as regras de gestão do patrimônio.
O alinhamento de interesses e a acomodação das expectativas pessoais dos membros da família é fundamental nesta discussão. Conquanto seja importante evitar discussões estéreis e preservar a integridade do patrimônio, nem sempre os
membros da família caminharão juntos no que diz respeito à gestão do patrimônio. Em muitos casos, para preservar será necessário separar.
Muitas vezes, com o objetivo de proteger o patrimônio, o gestor, ou quem tem a missão e o poder de tomar essa decisão, propõe-se a manter a gestão do patrimônio de forma consolidada, dispondo-se até mesmo a ouvir os membros da família. Entretanto, essa pode não ser a melhor estratégia de patrimonial para uma determinada família.
Na ânsia de resolver uma questão sensível, um problema ainda maior pode surgir. A comunicação dentro da família, no sentido de bem se compreender quais são os objetivos de cada membro e, desta maneira, definir-se o papel de cada um, é fundamental no processo de governança.
Neste contexto, as estruturas patrimoniais também devem ser discutidas. Não existe uma estrutura única e perfeita ou uma solução mágica para resolver as questões de sucessão de uma determinada família. Cada planejamento sucessório deverá ser capaz, tanto quanto possível, de atender as particularidades e visão de mundo daqueles que estiverem nele envolvido.
Para que tal objetivo seja atingido, é comum classificar o patrimônio em ativos líquidos (investimentos financeiros) e ativos não-líquidos (imóveis e participações societárias), facilitando-se a implementação de estratégias e ferramentas que melhor se amoldam a cada qual
Com relação aos ativos líquidos, e de modo geral, temos:
Fundos fechados – que constituem um importante instrumento de planejamento sucessório não só pela possibilidade da transferência das cotas por meio de doação, como também pelo fato de que seu regulamento poderá conter algumas determinações quanto a sucessão. Além disso, apesar das possíveis mudanças, esses fundos deverão manter algumas características fiscais importantes, como a possibilidade de compensação de lucros e perdas e a isenção de imposto nas realocações dentro do fundo;
Fundos de previdência – também têm um forte apelo neste sentido, uma vez que não passam pelo processo de inventário quando da distribuição para os beneficiários;
Seguro de vida – é utilizado no planejamento sucessório considerando a isenção de Imposto de Renda no recebimento do benefício, a não incidência de ITCMD (Imposto de Transmissão de Causa Mortis e Doação) e o fato de não depender de inventário para que ocorra a distribuição.
Quanto aos não líquidos temos, basicamente, os seguintes instrumentos:
Holdings patrimoniais – para ativos imobiliários e participações societárias, também são veículos utilizados constantemente no sentido de organizar a sucessão familiar, sendo muitas vezes um pilar necessário na estrutura de governança da família;
Fundos Imobiliários (FII) e os Fundos de Participação (FIP) – detêm respectivamente ativos imobiliários e participações societárias e funcionam também como veículos de planejamento sucessório. Na forma de condomínio fechado, podem ter suas cotas transmitidas por doação.
A sucessão de bens localizados no exterior é outro ponto importante neste contexto. A legislação em vigor determina que o Brasil só é competente para realizar a partilha de bens localizados em território nacional. Nesse sentido, é importante que exista uma estrutura de sucessão no exterior com o objetivo de organizar previamente a distribuição desses bens, tornando mais simples esse processo para a família.
Recentemente, inclusive, o STF reconheceu, por nove votos a um, que os estados não podem cobrar ITCMD sobre heranças e doações do exterior, o que certamente atribuirá maior segurança jurídica aos planos de sucessão que se valham desta estratégia.
Como fica claro, portanto, são diversas as variáveis e estratégias a serem consideradas na elaboração de um plano de sucessão patrimonial, que está longe de ser um assunto simples. As decisões a serem tomadas são complexas e, não raro, induzem insegurança e intranquilidade, embora sejam necessárias.
Enfim, ainda que o apoio profissional de advogados e gestores globais de patrimônio especializados em planejamento patrimonial seja cada vez mais relevante e necessário, o melhor momento para discutir o planejamento sucessório é exatamente quando ainda não precisamos dele.
Por Eduardo Pires