O uso de veículo próprio do empregado para a execução de serviços pelos quais ele foi contratado impõe ao empregador o dever de ressarcir o colaborador dos gastos com combustível e manutenção, além de indenizá-lo pela depreciação do bem.
A 4ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (TRT-2) adotou esse entendimento ao julgar procedente o recurso ordinário trabalhista interposto por dois funcionários de uma empresa de sistemas de monitoramento, em Santos (SP).
Antes, ao apreciar outro recurso da mesma reclamação, o colegiado já havia reconhecido o vínculo empregatício entre esses dois recorrentes e um terceiro trabalhador, pois eles haviam sido contratados como pessoas jurídicas.
Com o reconhecimento do vínculo, a recorrida foi condenada a pagar aos empregados as verbas decorrentes dessa relação, como aviso prévio, 13º salário, férias e indenização de 40% do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) pela dispensa imotivada.
Ônus do empregador
Relatora dos recursos, a desembargadora federal do trabalho Maria Isabel Cueva Moraes frisou que “todos os custos decorrentes da exploração da atividade empresarial devem ser suportados pelo empregador, sob pena de afronta ao estuário normativo trabalhista”.
A julgadora fundamentou o seu voto no artigo 2º, caput, da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), reforçando ser “vedada a assunção pelo empregado dos riscos inerentes ao empreendimento, os quais são sofridos apenas pelo empregador”.
No caso dos autos, a relatora considerou incontroversa a utilização de veículo particular para prestação de serviços à reclamada, sem o ressarcimento dos gastos realizados, sendo desnecessária a juntada de notas fiscais.
“Por decorrência lógica, presume-se que os autores, ao usarem veículo próprio para prestar serviços à reclamada, tiveram que desembolsar valores para abastecimento e manutenção do referido bem, face ao seu natural desgaste”, anotou Maria Isabel.
Com base nos artigos 852-D da CLT e 335 do Código de Processo Civil, a desembargadora arbitrou em favor dos recorrentes indenização de R$ 600,00 mensais, a título de manutenção, depreciação pelo uso e combustível, nos períodos indicados na inicial.
Vínculo reconhecido
Representados pela advogada Sue Ellen Santos Prata, do escritório Prata Advocacia, os trabalhadores, inicialmente, tiveram que ter reconhecido o vínculo empregatício com a Porto Seguro Proteção e Monitoramento, que os contratou como pessoas jurídicas.
O juízo da 4ª Vara do Trabalho de Santos julgou improcedente esse pedido, mas a 4ª Turma do TRT-2 acolheu a tese recursal da advogada de que o contrato celebrado entre a empresa e os recorrentes burlou as leis trabalhistas, em detrimento dos contratados.
Segundo a relatora, sob o subterfúgio da “pejotização”, a empresa cometeu “fraude trabalhista”, com o claro intuito de desvirtuar, impedir e fraudar a aplicação dos preceitos trabalhistas.
Essa conclusão foi tirada por meio da análise do próprio contrato. Além de os serviços contratados estarem inseridos na atividade-fim da reclamada, o documento deixa patente a falta de autonomia na sua prestação.
Por exemplo, as ordens de serviço para a instalação e manutenção dos sistemas de segurança eram emitidas pela reclamada, que também determinava os horários a serem cumpridos e os prazos de entrega.
Qualquer alteração no cronograma dependia de autorização expressa da demandada. O contrato ainda deixa claro que os reclamantes estavam sempre à disposição da reclamada, pois podiam ser acionados a qualquer tempo para serviços não cadastrados.
Manual de condutas
A relatora também destacou que o contrato de prestação de serviço obrigava os recorrentes a observar “regras fixadas no manual normativo para instalação incompatíveis com o trabalho autônomo”.
Entre essas regras estão a necessidade de vestir calça jeans azul, que não poderia estar desbotada, e camisa da própria Porto Seguro, limpa e por dentro da calça, além de jaqueta da ré. Outra exigência com a indumentária diz respeito ao uso de cinto preto.
Até “normas de comportamento”, conforme frisou a relatora, constam do manual normativo. Elas exigem dos contratados cuidados com a barba e o corte de cabelo, além de proibi-los de pronunciar gírias e apelidos, e de usar óculos, brincos ou piercings.
Fonte: CONJUR