É preciso uma regulação que se ajuste ao trabalho por aplicativos

Algumas leis recentes podem nos dar uma pista de como esse emprego poderia ter proteções sociais. Atualmente, o Brasil conta com cerca de 190 plataformas de aplicativos em operação, os quais respondem por 120 projetos de lei (PLs) e quase 8.000 ações trabalhistas.

Não é preciso mais do que esses números para estarmos convictos da necessidade de regulamentação dessas atividades. No entanto, fato evidente — e que desperta a intolerância da sociedade — é a desproteção desses profissionais, que, assim como todo e qualquer trabalhador, estão sujeitos a acidentes, doenças, limitações por idade avançada, entre tantas intercorrências que exigem medidas protetivas básicas.

A tecnologia responsável por propiciar incontáveis formas laborais avançou muito mais depressa do que as leis de proteção. No Poder Legislativo de vários países, assistimos a um vaivém de leis, ora tratando os trabalhadores como autônomos, ora como empregados. No âmbito do Judiciário, acontece o mesmo. Há sentenças de todos os tipos, e, com frequência, os recursos anulam as decisões iniciais — e vice-versa.

Não há dúvidas de que o trabalho por meio das plataformas tem características particulares, a começar pela flexibilidade de locais e períodos. Além disso, o trabalhador dispõe de autonomia suficiente para decidir o que e quando fazer. Muitos, inclusive, prestam serviços para várias plataformas ou, ainda, combinam a atividade com um emprego convencional.

No entanto, há quem busque pessoalidade, habitualidade e subordinação comandadas pelos algoritmos da inteligência artificial (IA), que administram sistemas de metas e premiações para enquadrar esses profissionais como empregados.

Tudo indica que esse embate, que ocorre tanto no Legislativo quanto no Judiciário, tenda a se prolongar por muito tempo, caso não seja proposto algo, de fato, condizente com as peculiaridades que caracterizam o setor. É preciso uma forma de regulação capaz de se ajustar a essa nova forma de contratação. Essa proteção pode ser perfeitamente atendida pelas leis da Previdência para os que trabalham de forma independente, pois asseguram proteções sociais previdenciárias e não celetistas.

Obviamente, essa autonomia tem um limite, porém é nítida a distância entre a situação de liberdade dos que exercem suas atividades por aplicativo e o rigor do trabalho presencial (ou virtual) dos que trabalham nos empregos convencionais.

O Ministério Público do Trabalho (MPT) tem proposto ações coletivas com a pretensão de enquadrar, com rigor, o trabalho por aplicativo nas características do vínculo empregatício. Por outro lado, cabe registrar a inadequação dos que dispensam qualquer tipo de regulação por considerar que o profissional atuante nas plataformas seja campeão das liberdades laborais. Eis o motivo da dificuldade de se identificar a precisa natureza jurídica do seu trabalho.

O Brasil já dispõe de um aparato institucional para proteger os não empregados, como profissionais autônomos, microempreendedores individuais (MEIs) e tantos outros. Recentemente, foi aprovada a Lei Complementar 181/2021, que trata do MEI, voltado especificamente a profissionais da classe de caminhoneiros, na qual se respeita a sua autonomia, conferindo-lhe proteção social/previdenciária.

No mesmo sentido é considerada a Lei do Salão Parceiro (Lei 13.352/2016), que prevê a possibilidade de profissionais de salões de beleza firmarem contratos com estes por meio de pessoas jurídicas, em que há proteções previdenciárias, mas não celetistas, para os trabalhadores autônomos.

Essas duas leis, juntamente com a Lei 123/2006 (Lei do Microempreendedor Individual), podem nos dar uma pista de como o trabalho pelas plataformas poderia ser regulado com proteções sociais/previdenciárias.

EDUARDO PASTORE – Assessor jurídico da FecomercioSP

fonte:JOTA

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