Dois pesos e duas medidas para o ‘distinguishing’ no CARF e para o PAF
Não pretendemos ser repetitivos ao reavivar o debate sobre a questão da atração do ‘distinguishing’ para a solução de conflitos administrativo-tributários pelos conselheiros do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF) [1]. Buscamos, sim, demonstrar o quão necessário é analisar a matéria sob diferentes prismas.
Pois bem, ‘distinguishing’ “é a prática de não aplicar dado precedente vinculante por se reconhecer que a situação sub judice (aquela que se está julgando imediatamente) não se encarta nos parâmetros de incidência do precedente.”, conforme nos apresenta FRÓES [2].
A aplicação do ‘distinguising’ na esfera do CARF ganhou notoriedade quando em sessão de julgamentos conselheiros com representação dos contribuintes apresentaram voto que supostamente contrariava Súmula do Tribunal Administrativo, seguido de constrangimento pela presidência da Turma julgadora sustentando que faria a representação desses, pois estariam a proferir posicionamento em contrariedade a Súmula CARF [3] [4] [5] [6].
Segue que identificamos, após exaustiva pesquisa de jurisprudência na base de dados do Tribunal Administrativo, julgado de Turma Ordinária do CARF que, ao analisar o agravamento de multa de ofício pela ausência de apresentação de livros contábeis firmou entendimento pela manutenção dessa multa (acórdão nº 1302-001.936), ou seja, posicionou decisão contrária ao contribuinte recorrente por voluntário, isto, em flagrante contrariedade à Súmula CARF nº 96 [7].
Nada foi dito!
Ocorre que, turma da Câmara Superior de Recursos Fiscais (CSRF), à unanimidade de votos, houve por bem ‘recolocar a matéria nos trilhos’ processuais administrativo-tributários, provendo recurso especial interposto pela contribuinte, atraindo para o caso a referida Súmula CARF nº 96 e, consequentemente, determinando o afastamento do agravamento da multa de ofício, equivocadamente mantida pela decisão recorrida (acórdão nº 9303-011.418).
A provocação que se faz aqui para reflexão é: o ‘distinguishing’, mesmo que implícito, somente ganha destaque e/ou sua aplicação é revertida com o emprego de instrumento regimental intimidatório de perda de mandato na hipótese de – legitimamente – se buscar dar solução mais favorável ao contribuinte, recorrente em processos administrativos submetidos ao crivo do CARF?
Esperamos ser a resposta negativa, pois caso contrário o papel institucional do Tribunal Administrativo restaria flagrantemente maculado por vício insustentável para com a entrega de justiça fiscal e a manutenção de paridade de armas entre contribuinte e a Administração.
Consignamos nossa ciência para o fato de que a longa mão do Estado se faz presente desde o início do procedimento fiscalizatório, somente retomado certo equilíbrio de forças quando franqueado o acesso do contribuinte ao CARF, face à tecnicidade de seus integrantes na oportunidade do exame dos processos colocados sob sua responsabilidade.
E assim esperamos seguir o Tribunal Administrativo no exercício de sua missão para com a sociedade, afastando-se da seguinte máxima bíblica [8], assim vazada e empregada com a devida ‘licença poética’ do escriba:
Não carregueis convosco dois pesos, um pesado e o outro leve, nem tenhais à mão duas medidas, uma longa e uma curta. Usai apenas um peso, um peso honesto e franco, e uma medida, uma medida honesta e franca, para que vivais longamente na terra que Deus vosso Senhor vos deu. Pesos desonestos e medidas desonestas são uma abominação para Deus vosso Senhor.
Amém!
fonte: JOTA -DALTON CESAR CORDEIRO DE MIRANDA