A segunda onda da covid-19 no Brasil, inicialmente desprezada por muitos, veio mais forte que a primeira e atingiu fortemente a grande maioria (senão todas) as empresas, as quais já vinham combalidas pelos impactos econômicos sofridos no ano passado, e dos quais sequer chegaram perto de recuperar.
Diferentemente do setor de comércio que teve a alternativa de migrar suas operações para o meio virtual; ou mesmo a indústria que, como atividade essencial, não foi paralisada, embora a inegável queda em suas operações; foi o setor de serviços, até aqui, o segmento mais duramente atingido pelas sucessivas e necessárias medidas de restrição de circulação e funcionamento, independentemente de se discutir a eficácia delas para a contenção e controle da pandemia.
A verdade é que empresas que dependem da presença física do cliente para que possam eles desfrutar da experiência proporcionada, veem-se agora completamente impossibilitados de manterem uma estrutura mínima no aguardo de uma nova janela de oportunidade de desenvolvimento do negócio, especialmente porque nada indica que, neste momento, um planejamento de retomada e reinvestimento reverterá algum efeito positivo nos próximos meses.
Ao contrário disso, tomando em consideração a experiência de países europeus, onde, no calendário da pandemia, sempre estiveram meses de a frente do Brasil, viu-se uma terceira onda de contaminação por covid-19 atingindo Alemanha, França e Itália, entre outros, causando, por consequência, uma nova onda de lockdowns e medidas restritivas que, novamente, atingiram em cheio as empresas, especialmente as micro, pequenas e médias.
Aliado a isso, a forte retração da atividade econômica acaba por gerar índices gigantescos de desemprego e perda de renda, diminuindo, assim, o poder de compra do consumidor e incrementando mais uma dificuldade à elaboração de um plano de recuperação para empresas que hoje se encontram endividadas, sem receita, sem acesso a linhas de crédito com custos minimamente razoáveis e – pior – sem qualquer previsão do que esta ainda por vir.
Essa tempestade (im)perfeita tem empurrado muitos empresários a ter de tomar uma decisão que, na cartilha do empreendedorismo, soa como um verdadeiro pecado capital: desistir. Afinal, como é comumente propagado em qualquer material, conteúdo ou mentoria para empreendedores, nada acontece sem resiliência que, no entanto, não pode ser confundido com insistência, muito menos teimosia ou, no limite, irresponsabilidade.
Ser empreendedor, acima de tudo, requer sabedoria, coerência e humildade para saber que, a partir de determinado ponto, o risco não justifica a tentativa e/ou investimento.
A partir dessa lógica e diante de um cenário econômico incerto e imprevisível, temperado pela existência de possível endividamento com empregados, aluguel, tributos e fornecedores, é fundamental que o empresário tome em consideração a alternativa de encerrar a empresa antes que perca completamente o poder sobre ela e seus ativos, ou mesmo acumule uma dívida que poderá colocar em risco outros bens pessoais e economias que poderão, no futuro, garantir-lhe a sobrevivência e mesmo a possibilidade de empreender novamente.
Caso a decisão de encerrar a empresa não seja deliberada e espontânea, o risco de que isso ocorra contra a vontade do empresário é gigantesca, seja no âmbito de um processo de falência formal onde os ativos são arrecadados e vendidos em leilão judicial (portanto muito abaixo do valor de mercado); seja pelo encerramento inevitável das atividades, por estrita falta de condições, pelo qual, sem que tenha havido qualquer planejamento prévio, estará o empresário sujeito a sofrer medidas e ações judiciais de seus credores, os quais concorrerão para receberem primeiro, levando a uma completa desorganização e dificuldade de administrar o endividamento e as alternativas para resolução dele.
De outro lado, caso seja inevitável o encerramento das atividades, certamente poderá o empresário se antecipar a situações e ações de credores que poderão não só evitar o prejuízo patrimonial iminente e desorganizado, assim como também criar, até mesmo com auxílio de medidas judiciais, estratégias de resolução do endividamento a partir de negociação, conciliação ou medida de recuperação judicial, embora essa sempre tenda a ser mais onerosa e arriscada pelo fato de poder ser convertida em falência em caso de não cumprimento do plano aprovado pelos credores e homologado pelo juiz.
Enfim, e ao cabo, a alternativa de encerramento deliberado das atividades da empresa diante da impossibilidade de manutenção delas deve ser cogitado não com ato de covardia ou desistência, e sim como providência coerente e alinhada ao perfil profissional que se espera do empresário, até para que a chama do empreendedorismo nele permaneça, permitindo a ele tornar a empreender tanto quanto possível.
Por: Eduardo Pires