Segundo a mitologia grega, Caos é uma das divindades que nasceram em primeiro lugar, que surgiram no momento da criação, e cujas formas constituem a estrutura básica do Universo. Caos teria sido a primeira fase do Universo, sendo, talvez, o vazio, o vácuo, ou mesmo a explosão que deu origem a todas as coisas.
Os filhos de Caos são Nix (a Noite) e Érebo (a Escuridão, as Trevas), e nasceram de cisões, ou seja, a partir de pedaços do Caos.
A decisão que o Min. Edson Fachin, do STF, proferiu neste dia 08 de março de 2021, e que chacoalhou toda a comunidade jurídica, poderia ser batizada de Nix ou Érebo.
Não há aqui, absolutamente, nenhuma intenção de analisar o mérito ou razões jurídicas dela, uma vez que fazer isso, de modo responsável e sério, exigiria cotejar as milhares de páginas do complexo e desdobrado processo que resultou no habeas corpus cuja ordem foi concedida neste dia.
A verdade, porém, é que veio do Min. Relator, a todo tempo rotulado como protetor da Operação Lava Jato, a decisão que, numa só penada, anulou todas as condenações impostas ao former Presidente Lula, restituindo-lhe os direitos políticos que poderão ser exercidos, inclusive, para que seja ele candidato ao Palácio do Planalto em 2.022.
A questão é compreender como e porque chegamos a este dia.
Chegamos a ele porque, enquanto sociedade, e provavelmente tendo assumido um dos lados radicais – e surdos – da disputa pelo “melhor discurso”, assistimos, passiva e irresponsavelmente, a destruição da política por um sentimento angustiante, selvagem e raivoso que convencionamos, cínica e convenientemente, chamar de Justiça.
O discurso moralista e cego que se seguiu, alimentou a crença de que seríamos salvos por mitos, super-heróis de toga ou acusadores paladinos, que bem poderiam ter saltado de “Os Intocáveis”.
Não fomos salvos. Fomos engolidos e traídos por nossa própria sede (irracional) de vingança e, após exatos 7 anos do início da Lava Jato (a primeira fase dela foi deflagrada em 17 de março de 2014), assistimos – incrédulos – suas bases ruírem.
A decisão proferida hoje pelo Min. Fachin, independentemente de restabelecer ou não o processo judicial como instrumento de tutela de direitos e imposição de sanções pela infringência da lei (assim como deveríamos ter cuidado que ele fosse, desde o princípio) deixa um terrível gosto amargo na boca de cada um.
Daqui pouco mais de um ano, se nenhuma outra parte do Caos se desprender, deveremos ter na disputa pelo comando do Brasil, despedaçado pela pandemia da Covid-19, Lula x Bolsonaro.
Que o Caos não nos poupe.
Eduardo Pires