‘Sob o falso manto de liberdade de expressão sem limites, o que se pretende é corroer a democracia’ disse ele na LIDE Brazil Conference .“Não é possível que as redes sociais sejam terra de ninguém”, disse Alexandre de Moraes, ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) e presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), em debate nesta segunda-feira (14/11). O evento, LIDE Brazil Conference-New York, conta ainda com a participação dos ministros Dias Toffoli, Gilmar Mendes, Ricardo Lewandowski, além do ex-ministro Carlos Ayres Britto, de Antonio Anastasia, do Tribunal de Contas da União (TCU), e do ex-presidente Michel Temer.
O encontro, promovido pelo ex-governador João Doria, reúne 260 empresários e discute, em duas mesas, o “Brasil e o respeito à liberdade à democracia”, assim como “A Economia do Brasil a partir de 2023”.
Moraes também defendeu não ser possível que as milícias digitais ataquem a democracia impunemente, sem que haja uma responsabilização, conforme o binômio: liberdade e responsabilidade. “Sob o falso manto de liberdade de expressão sem limites, o que se pretende é corroer a democracia. O que se pretende é corroer a liberdade em seus três pilares: na liberdade de imprensa, o sistema eleitoral e o Poder Judiciário”, observou.
Moraes ressaltou ainda que “as redes sociais devem ter absolutamente os mesmos tratamentos das outras formas de expressão”. O ministro citou o julgamento no STF do HC 82424, em que a Corte entendeu que o discurso de ódio, o discurso negacionista em relação ao holocausto e o discurso contra o povo judeu, não faz parte da liberdade de expressão. O livro, que continha esses ataques, não foi publicado e o autor foi responsabilizado criminalmente. A partir da citação, Moraes questiona: “Por que no livro é possível essa responsabilização e, se ele partilhar isso e colocar na rede, é censura?”.
Para o ministro, a responsabilização posterior não é censura. “As milícias digitais podem falar o que quiser, só que tem que ter coragem para serem responsabilizadas pelo que falam”, afirmou. “Não é censura porque falaram. É responsabilização posterior”.
O ministro ainda defende uma mudança de classificação das plataformas digitais. Segundo Moraes, elas deveriam ser responsabilizadas da mesma forma que as empresas de mídia. “Porque a mídia tradicional tem responsabilidade. As plataformas não podem se esconder sob uma suposta classificação de empresa de tecnologia para deixar passar desde ataques à democracia e ao estado de Direito, até pedofilia”, destacou.
Com relação às desinformações, o ministro Dias Toffoli citou conceitos de Celso Lafer, ex-ministro da Relações Exteriores, que entende que a grande disputa do mundo contemporâneo seria a disputa da narrativa do que é a verdade factual. Para o ministro, na era de extremismos, deve-se recuperar a verdade factual. “Se a gente diz que essa mesa é retangular e o nosso interlocutor diz que essa mesa é redonda, a gente fica sem base de diálogo, sem base de conversa. E depois isso se extrapola para o ódio, para a negativa do outro. Então devemos trabalhar a defesa da verdade factual. Nós não podemos deixar que o ódio entre em nossa sociedade, em nossas casas, em nossas famílias, em nossos relacionamentos”, ressaltou.
Ainda baseado em Lafer, Toffoli afirmou que três instituições podem defender a verdade factual: a imprensa livre e séria, a academia e a ciência, e a magistratura. Para além da ausência de verdade factual, o ministro acredita que os conceitos estão ‘fora de lugar’. “Pessoas autoproclamadas conservadoras no Brasil fecham as estradas, interrompendo o direito de ir e vir. Não é algo anticonservador? As coisas estão fora de lugar”, observou.
Com relação aos acontecimentos após as eleições de 2022, o ministro Luís Roberto Barroso destacou que “o Supremo é o povo e o povo já se pronunciou. A eleição terminou e agora só cabe respeitar o resultado. A vida na democracia é simples assim. O resto é intolerância, espírito antidemocrático, quando não, selvageria”, afirma.
Para Barroso, o Brasil deveria priorizar o combate à fome, o desenvolvimento sustentável, o investimento em educação básica, entre outros temas. Os problemas da educação no Brasil são, para ele, a não alfabetização das crianças na idade certa, a evasão escolar no Ensino Médio, o déficit de aprendizado e a baixa atratividade na carreira de magistério. “Quem acha que o problema da educação no Brasil é escola sem partido, identidade de gênero, ou saber se 1964 foi golpe ou não foi golpe está assustado com a assombração errada e está nos atrasando na história”, ressaltou.
Em sua fala, o ministro Gilmar Mendes defendeu que, diante do cenário de erosão Constitucional iniciado com a ascensão do populismo, “o Estado brasileiro possui admirável resiliência. Quando tudo parecia esfarelar, ouvimos, à exaustão, o mantra: ‘as instituições estão funcionando’. Bem ou mal, elas funcionaram. A institucionalidade venceu”, afirmou.
Porém, segundo o ministro, é preciso dar atenção a importantes segmentos da sociedade que questionam o STF e se recusam a acatar os resultados das eleições. “Merece atenção porque denota estado de dissonância cognitiva coletiva, cuja prolongação no tempo também parece ter ocasionado modificações profundas na sociedade brasileira”, observou. Leia aqui o discurso do decano do STF na íntegra.
Já o ex-ministro Carlos Ayres Britto ressaltou que é necessário ensinar a enxergar o Brasil pelo prisma da Constituição. Citando Fernando Pessoa, destacou: “O universo não é uma ideia minha, a ideia que eu tenho do universo é que é uma ideia minha, logo rédea curta comigo. Eu tenho que me salvar de mim mesmo, do meu voluntarismo, do meu autoritarismo, da minha subjetividade exacerbada”.
fonte: JOTA