LC 194/22: redução de alíquotas do ICMS e impactos na carga tributária

Legislação foi aprovada às pressas para frear aumento de preços .O Supremo Tribunal Federal, ao julgar o Tema 745 de Repercussão Geral, já havia reconhecido que a energia elétrica e os serviços de telecomunicação são essenciais e, portanto, as operações e prestações correlatas não poderiam se sujeitar a alíquotas de ICMS superiores àquelas aplicáveis às operações e prestações em geral.

Embora a decisão tenha sido favorável aos contribuintes, a corte decidiu pela modulação dos efeitos da decisão, estipulando que ela produziria efeitos a partir de exercício financeiro de 2024, ressalvadas as ações ajuizadas até o início do julgamento do mérito, em 5 de fevereiro de 2021.

Diante desse cenário, esperava-se que eventual redução do ICMS sobre operações ou prestações com energia elétrica e serviços de telecomunicação somente ocorreria em 2024 e, obviamente, tal medida seria implementada pelos estados e pelo Distrito Federal. A questão, porém, ganhou novos contornos com a aprovação, pelo Congresso Nacional, do PLP 18/2022, convertido na Lei Complementar 194/22.


Como se sabe, a lei em questão promoveu alterações na legislação relativa ao ICMS para, na linha do que foi decidido pelo STF, tratar como essenciais os combustíveis, o gás natural, a energia elétrica, as comunicações e o transporte coletivo e estabelecer que as alíquotas do ICMS incidentes sobre operações e prestações correlatas não poderiam ser superiores às das operações em geral.

Referida norma, contudo, passou a produzir efeitos imediatos, ou seja, obrigou os estados e o Distrito Federal a reduzirem, desde logo, o ICMS incidente sobre operações e prestações com energia elétrica, comunicações, etc., ensejando inúmeras discussões no que diz respeito aos impactos orçamentários e a forma de compensação, pela União, das perdas na arrecadação.

Em decisões recentes, por exemplo, o ministro Alexandre de Moraes concedeu tutela de urgência garantindo aos estados de São Paulo (ACO 3590) e Piauí (ACO 3591) a possibilidade de compensar, de imediato, as parcelas dos contratos de dívidas com a União com os valores correspondentes à perda de arrecadação causada pela redução de alíquotas do ICMS.

Ocorre que, a despeito da relevância dos impactos orçamentários dessas medidas e das discussões correlatas, pouco se tem falado sobre os efetivos reflexos dessa redução no preço final das mercadorias e serviços.

Como é sabido, o principal motivo para a rápida tramitação e aprovação do projeto de lei foi o aumento dos preços de bens e serviços, em especial dos combustíveis. Esperava-se, portanto, que o impacto da medida fosse imediato, ou seja, implicasse em redução efetiva do valor cobrado do consumidor, reduzindo a inflação.

Aparentemente, portanto, se presume que a redução das alíquotas do ICMS resultará, necessariamente, em diminuição dos preços praticados. E isso decorre do equivocado entendimento no sentido de que tais preços são altos por conta das alíquotas desse tributo.

De fato, não se pode ignorar o impacto desse tributo na definição dos preços atribuídos às mercadorias e serviços, ainda mais considerando que o ICMS se inclui na sua própria base. Para se ter uma ideia: uma alíquota nominal de ICMS no patamar de 18% resulta numa alíquota real de quase 22%. Se aumentamos a alíquota nominal para 25%, por sua vez, a alíquota real passa de 33%, o que, sem dúvida, é uma carga tributária significativa.

No entanto, esse não é o único tributo que interfere no preço do serviço a ser prestado ou da mercadoria comercializada. Por óbvio, os agentes econômicos definem seus preços considerando todos os custos da atividade, aí incluídos inúmeros outros tributos de que pouco se fala.

Pensemos, por exemplo, nas empresas de telefonia, as quais vêm sendo questionadas pela Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) por supostamente não repassarem a redução do ICMS para os seus consumidores.

Essas empresas, além de recolherem os tributos devidos pelas pessoas jurídicas em geral (IRPJ, CSLL, Contribuição ao PIS, Cofins, entre outros), sujeitam-se ao pagamento de contribuições das mais diversas (Contribuições ao Fust e ao Funttel, por exemplo), as quais, embora tenham alíquotas reduzidas, certamente impactam no preço do serviço prestado. Há que se considerar, ainda, taxas de fiscalização das mais diversas, como aquelas relacionadas ao funcionamento de torres e antenas de transmissão e cuja constitucionalidade se discute perante o Supremo Tribunal Federal (RE 776.594 – Tema 919 de Repercussão Geral).

Afora os diversos tributos exigidos dos agentes econômicos, é preciso lembrar, também, que a carga tributária muitas vezes é maximizada não por conta da instituição de novas exações ou pelas alíquotas elevadas, mas sim em razão da base de cálculo prevista na legislação.

O ICMS é, de novo, um ótimo exemplo. Como já destacado, muitos estados reduziram as alíquotas do imposto para atender ao disposto na Lei Complementar 194/22. Todavia, continuam incluindo, na sua base de cálculo, encargos vinculados às operações com energia elétrica, como a Tarifa de Uso do Sistema de Transmissão de Energia Elétrica (TUST) e à Tarifa de Uso do Sistema de Distribuição (TUSD).

Para além de contrariar o disposto na legislação complementar — que passou a prever, expressamente, a não incidência do imposto sobre esses encargos (art. 3º, X, da Lei Complementar 87/96, com a redação dada pela LC 194/22) —, essa medida, sem dúvida, reduz os efeitos das modificações promovidas nas alíquotas.

Seja como for, os exemplos demonstram que, para reduzir efetivamente a carga tributária e, desse modo, o preço de mercadorias e serviços, não basta simplesmente reduzir as alíquotas do ICMS. É necessário alterar a forma de cobrança de inúmeros outros tributos, cuja instituição compete a entes diversos.

Fonte: JOTA por MARINA VIEIRA DE FIGUEIREDO

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