Decisão permite que 30 mil associados da Associação Paulista de Medicina não recolham tributo segundo nova lei
Na semana passada escrevi por aqui sobre como a celeuma envolvendo a fórmula de cálculo do ISS em São Paulo – até então restrita a advogados – poderia ser expandida a outros setores. A ampliação veio nesta segunda-feira (23/5), após o deferimento de uma liminar permitindo que os associados da Associação Paulista de Medicina (APM), ao calcularem o imposto, desconsiderem a Lei 17.719/2021, que alterou a sistemática de recolhimento do tributo.
Após a Lei 17.719/2021, para sociedades unipessoais, como escritórios de advocacia e contabilidade e consultórios médicos, o ISS passou a ser calculado com base em uma receita bruta presumida, que varia conforme a quantidade de profissionais habilitados na sociedade. No caso dos advogados, os primeiros a irem à Justiça questionando a alteração, a alegação era de que a mudança poderia acarretar aumento de mais de 2.000% no montante a recolher do imposto.
No caso dos médicos, o tema é discutido no processo 1024691-33.2022.8.26.0053, analisado pela 3ª Vara da Fazenda Pública de São Paulo. Para o juiz Marcelo Hannoun, que deferiu a liminar favorável à associação, a utilização de faixas de receita bruta presumida, conforme prevê a Lei 17.719/2021, é contrária ao que prevê o Decreto Lei 406/68.
A norma, recepcionada pela Constituição, prevê o cálculo do ISS por meio de alíquotas fixas, com base na natureza do serviço, “não compreendendo a importância paga a título de remuneração do próprio labor”. Ainda sobre o tema, o Supremo Tribunal Federal (STF), por meio do RE 940.769/RS, fixou a tese segundo a qual “é inconstitucional lei municipal que estabelece impeditivos à submissão de sociedades profissionais de advogados ao regime de tributação fixa em bases anuais na forma estabelecida por lei nacional”.
Com o deferimento da liminar, o município está proibido de autuar, inscrever em dívida ativa, negar emissão de certidão de regularidade fiscal e efetuar cobrança (administrativa ou judicial) de valores de ISS calculados de acordo com a Lei 17.719/2021. A medida vale para associados da APM.
De acordo com Marun David Cury, diretor de defesa profissional da APM, a entidade possui mais de 70 mil associados, sendo que metade está na capital paulista. Segundo ele, entre os médicos a alteração trazida pela Lei 17.719/2021 gera um aumento de, em média, 70% no ISS. Cury diz que a maioria das sociedades uniprofissionais de médicos tem até seis profissionais.
A Lei 17.719/2021 prevê a incidência de uma alíquota de 5% sobre uma receita bruta presumida, tomada com base na quantidade de profissionais habilitados na sociedade unipessoal. Assim, quanto mais profissionais na sociedade maior o impacto gerado pela nova regra. No caso de sociedades unipessoais com poucos profissionais o aumento de carga tributária é baixo ou inexistente.
De acordo com a exposição de motivos da Lei 17.719/2021, no ano passado existiam 3.642 sociedades unipessoais de medicina e biomedicina no município de São Paulo, com 10.963 sócios e faturamento de R$ 2,7 bilhões. A categoria recolheu R$ 4,9 milhões em ISS em 2020.
As liminares obtidas tanto por médicos quanto por advogados (atualmente, nenhuma banca de advocacia de São Paulo está obrigada a recolher o ISS por meio da nova sistemática) frustra os planos de incremento de receitas pela capital paulista. Ainda segundo a exposição de motivos da Lei 17.719/2021, era esperado impacto positivo de cerca de R$ 200 milhões anuais aos cofres do município.
Para Cury, a alteração na fórmula de cálculo do ISS na capital paulista é ainda mais brutal por vir após o pior momento da pandemia, no qual a classe médica foi muito requisitada. “Na hora que a coisa esfria [a categoria] leva essa punhalada nas costas”, desabafa.
Fonte: JOTA