Nos últimos anos, houve um significativo aumento do interesse pelas chamadas “holdings patrimoniais” (ou familiares), como se fossem elas um tipo de blindagem jurídica que garantiria a manutenção perpétua do patrimônio pessoal e/ou familiar, inclusive para afastar qualquer risco desse patrimônio ser atingido por dívidas de qualquer natureza.
Embora a holding (ou empresa de administração de bens próprios) seja uma importante ferramenta no âmbito do planejamento de patrimonial, é evidente que sua constituição, por si só, e muito menos de maneira indiscriminada e genérica, é insuficiente para garantir ao indivíduo um salvo-conduto para não pagar por suas dívidas.
Muito ao contrário disso, qualquer instrumento de planejamento patrimonial que seja aplicado com o mínimo de seriedade e realismo, levará em consideração os riscos a que o patrimônio pessoal e/ou familiar está exposto para, a partir daí, traçar uma rota pela qual sejam mitigados os riscos, resguardando-se ao indivíduo uma segurança patrimonial mínima, mas sem que isso possa ser caracterizado como fraude civil ou mesmo penal.
Fora dessa perspectiva, tratar a holding patrimonial como uma saída mágica para dívidas somente contribui para a marginalização do instrumento, embora seja ele absolutamente lícito e, na maioria das vezes, extremamente benéfico em comparação a uma gestão patrimonial “crua” e não planejada.
Dentre os principais benefícios, destaco:
Proteção patrimonial - ao criar uma empresa para administrar o patrimônio pessoal e/ou familiar, é possível estabelecer uma separação legal entre o patrimônio pessoal e os ativos da empresa. Isso pode ajudar a proteger o patrimônio pessoal contra eventuais dívidas e responsabilidades da empresa, desde que sejam respeitadas as regras de legalidade e boa-fé na sua constituição e gestão. Planejamento sucessório - através de uma empresa de administração patrimonial, é possível realizar um planejamento sucessório eficiente. O proprietário pode determinar como será a sucessão do patrimônio, estabelecendo regras claras para a transferência de ações ou cotas da empresa aos herdeiros, garantindo a continuidade da administração e protegendo o patrimônio familiar.
Flexibilidade de gestão - com uma empresa dedicada à administração do patrimônio pessoal, o proprietário pode ter maior flexibilidade na gestão dos ativos. A empresa pode contratar profissionais especializados, como gestores de investimento, planejadores financeiros e contadores, para auxiliar na administração dos ativos e na maximização dos resultados.
Planejamento tributário - dependendo da estrutura e dos objetivos da empresa, é possível utilizar estratégias de planejamento tributário para otimizar a carga tributária sobre o patrimônio. Existem diferentes formas de organização empresarial e regimes tributários disponíveis no Brasil, e cada um pode oferecer vantagens específicas em termos de impostos e obrigações fiscais.
Profissionalização da administração - ao criar uma empresa para administrar o patrimônio pessoal, o proprietário pode estabelecer processos e práticas mais profissionais na gestão dos ativos. Isso pode incluir a definição de políticas de investimento, elaboração de relatórios financeiros periódicos e adoção de boas práticas de governança corporativa.
Mas, como nem tudo são flores, há também alguns pontos de atenção que deverão ser considerados e ponderados no desenvolvimento de programas de planejamento patrimonial nos quais se opte pela constituição de uma holding:
Responsabilidade limitada - embora a separação entre o patrimônio pessoal e os ativos da empresa seja uma vantagem, em certos casos, os credores podem buscar a desconsideração da personalidade jurídica da empresa. Isso significa que, em situações de fraude, abuso de direito, desvio de finalidade ou confusão patrimonial, os bens pessoais do proprietário podem ser alcançados para satisfazer dívidas da empresa.
Complexidade administrativa e custos - a criação e a manutenção de uma empresa envolvem formalidades legais, contábeis e administrativas, o que pode demandar tempo e recursos. É necessário cumprir obrigações fiscais, societárias e trabalhistas, além de arcar com custos de registro, contabilidade e consultoria profissional. É importante considerar esses custos e obrigações antes de tomar a decisão de criar uma empresa para a administração do patrimônio pessoal.
Limitações de acesso aos ativos - ao transferir os ativos para uma empresa, o proprietário pode ter restrições no acesso direto aos mesmos. A administração dos ativos fica sob responsabilidade da empresa, e o proprietário precisa respeitar as regras e procedimentos estabelecidos pela estrutura societária. Isso pode limitar a flexibilidade na administração dos ativos e na tomada de decisões.
Mudanças na legislação e tributação - as leis e os regulamentos podem sofrer alterações ao longo do tempo, inclusive no que se refere à tributação de empresas e do patrimônio. Mudanças nas regras fiscais podem afetar a eficácia das estratégias de planejamento tributário utilizadas e exigir adaptações na estrutura da empresa. É necessário estar atualizado sobre as obrigações legais e fiscais aplicáveis e considerar a possibilidade de mudanças futuras.
Risco de mercado e investimento - a administração do patrimônio pessoal pode envolver a gestão de investimentos e riscos associados a mercados financeiros. Os resultados dos investimentos podem variar e estar sujeitos a flutuações do mercado.
Como praticamente tudo na vida, é essencial ponderar todos os aspectos positivos e negativos para a tomada de uma decisão. Tratando-se de constituir um holding patrimonial para administração dos bens próprios e/ou familiares, não é diferente. É importante ter uma estratégia de investimento bem definida, buscar assessoria especializada para tomar decisões informadas e mitigar riscos.
Eduardo Pires